Parece dezembro de um ano
inteiro que não tem fim
Todos esperam que passe a
agonia, noites quentes, tardes com pés e mãos frias, peito apertado e cabeça de
liquidificador
Parecem felizes na
fotografia, o corpo já não age como antigamente
Nos últimos tempos envelheci mais de mil anos
E hoje, naquele instante,
me parece meio doente, com um sorriso amarelo de quem quer ser inocente
Só se eu fosse demente,
para não abrir o armário e expulsar esse percevejo voador
O filme, quando revelado,
não é tão bonito assim
Confusões no gravador
desconcertam as certezas outrora juradas
Quando me lembro, me
descubro vivendo os dias que me juraram ser dourados
Latão vale mais que
alumínio acobreado, porque o primeiro insiste de fato e o segundo não passa de
uma invenção do diabo para enganar a boa fé
Espalham fatos e histórias
que não foram, nem de longe, vividos com tamanha intenção
Hoje não tem discussão,
nada é tão importante assim
Apesar de hoje, ter essa
carga sangrenta nos meus olhos, consigo enxergar que amanhã há de ser outro dia
Torço para desentortar
Nem que seja o sorriso na
minha boca cheia de dentes, e a parte direita do meu rosto que não para de trepidar
Quando chegar o momento,
vou cobrar com juros os lucros desse meu sofrimento
Quero desinventar a
ressaca constante que se instalou nos meus olhos
Amanhã vou tentar me
reconquistar e dar valor do céu que aprendi a querer bem
Me entalo com pão
enquanto vejo o que acontece no templo de salomão
Enchem a igreja de
pessoas, oram para não chegar as suas horas, mas não procuram a solução
Ao tempo que voltam para suas
casas, não respeitam a palavra minutos antes professada, esculhambam mãe e pai,
aos irmãos não pedem perdão
Não teem paciência com o
tempo, parecem não sentir o lamento, alimentam ainda mais as suas dores, a
aflição
Fico por aqui cantando e
catando seus cacos, seus desagrados, palavras fortes de quem não sabe pedir
socorro ou chorar a sua descendente solidão
Templos e casas cheias de
fantasias, mas no peito, no cerne da questão, habitam personagens assustados,
covardes, e por vezes fria
Com o passar do tempo vai
gastando esse status de personalidade difícil e revelar o que deveras sempre
foi, alguém que covardemente grita para espantar a sua fraqueza e a sua incapacidade
de acolher e de procurar solução, sempre deixando na mãos dos outros, sempre
responsabilizando o alheio e deixando a vida para depois
Não esqueçamos que esse
lance de solução é daqueles que de fato resolvem os problemas, diferente
daqueles que somente comentam o que “deveria ser feito” e não pegam no cabo da
inchada para semear a solução
É um lance bem mais
profundo que o simples e covarde “comentário”, que quer ter uma validade que
não lhe merece
Até porque, nessa altura
do campeonato, quem me chegar para representar esse tipo de prosa, não vale
mais que um punhado de bosta, porque comentar o problema sem solução já é fazer
parte dele seu cagão
Vou esperar... estou
esperando, enquanto contemplo o embranquecer dos meus cabelos e envelheço o
gosto do vinho nas papilas
Confiando na providência,
tomando vergonha na cara, me livrando dos ansiolíticos, do refrigerante sabor
Cola
Deixa chegar a hora, por
enquanto o meu rosto diz que sim, e o meu peito ainda não
Roberta Moura