Quem sou eu

Minha foto
Todos os dias a Arte me toma de assalto e me leva para a Vida Real. Troco palavras, vejo pessoas, vivo um dia após o outro, como se o de ontem não tivesse existido, como se o de amanhã ainda estivesse muito longe de chegar.

quinta-feira, 22 de março de 2018

Um amorzão da porra

Berlim, Jan2017.


Todos os dias  escrevo na minha mão um pedaço dessa história sem fim
Como um diário de um dia para um avida inteira, que vai além dessa vida aqui, que é a única que as vezes pareço conhecer
Caminhos de sol, casa com gramado e cerca branca, não queremos mais que isso
Que andar de mãos dadas, nos beijarmos na rua, sentir o cheiro do cabelo e do suor
É preciso mesmo muita coragem para se despojar dos excessos, para se desprender do pudor, para desenhar ocultamente os caminhos que a vida nos rabiscou
É preciso um amorzão da porra para resistir a tudo, e ao final de tudo ainda ser quem somos
Nos reconhecer de perto e de não tão perto, saber o que o outro pensa com um olhar, com uma respiração mais profunda, com uma das sobrancelhas arqueadas, com o toque das mãos
É preciso amar demais, mesmo que por vezes aparente ser jamais, e aprender que o nunca não teve chances nas nossas vidas
Temos sede de viver e isso é palpável, é doce, líquido, quente, ardente, feliz, confuso e triste, é chato, abusado, cautelosos, cuidadoso e sempre amoroso
Nós somos o que nascemos para ser!
Nunca nos rotulamos para não ter que romper
Nos dias de hoje é preciso muita coragem para amar, para aprender o valor do amor do outro e dos outros, é preciso coragem para deixar ser amado
É assustador mas é real, lindo, vivo, ímpar, singular, tão nosso
Um estado de sanidade duvidosa, mas que a única certeza que se apresenta pela manhã é a de que é real, que estamos conscientemente apaixonados, que sempre estivemos, que sempre estaremos
Fazemos planos para um futuro brilhante, para breve, sem data para chegar
Vivemos em um tempo só nosso, fabricado sob medida, invisível, legítimo
Ninguém nunca está preparado para um amor desses, talvez passemos nossas vidas inteiras para entender cada fase, cada descoberta, cada dor que ele provocou, cada ensinamento, cada despedida, cada retorno, cada batalha perdida ou vencida...
...Mas de uma coisa temos clareza, que durante tudo isso e todo o lastro de tempo que se esvaio por entre nossos dedos, essa certeza nunca nos abandonou, somos o amor da vida e além da vida do outro


Roberta Moura




sábado, 17 de março de 2018

Do outro lado do tempo


Londres, Dez .2016.


Todas as semanas ela me escreve longas cartas, tem sido assim a tanto tempo que eu nem lembro mais
E eu, desse outro lado do atlântico, de mãos atadas, espero devotamente esse papel
Quanto sentimento cabe nesse papel?
Quando a gente conversa por esses escritos, contando com detalhes tudo o que se passa, a minha impressão é que eu recebo as notícias sempre em primeira mão, tento me enganar insistentemente
Como se o tempo parece no intervalo daquela postagem e somente voltasse a contar quando meus olhos estivessem voltados aquela letras redondas
Quanto amor cabe no espaço do tempo?
Na minha cabeça, no coração e no bolso a levei para passear em todos os lugares dessa cidade monárquica
Em cada parque, em cada avenida... imaginando como seria andar com ela de mãos dadas, aquecendo-a do frio, esquentando os meus pés nos seus
Aqui nessa nublada urbe tudo me faz lembrar quem nunca esteve aqui
Viver de imaginação não é nada fácil, mais vale a sentimentalidade
A imaginação é tão bondosa quanto maléfica e por vezes me pego pensando no que ela está fazendo agora
As minhas cartas não podem chegar com a mesma agilidade, não tem endereço para ser entregue
O extravio das informações me assusta de uma forma brutal e a ela também
Mas o que fazer um amor sobreviver por tanto tempo e a tantas coisas...? alimentar de memórias com cabeta e pedaços de papel é quase missionário
Ela do lado de lá, levando a vida dela, com filhos, esposo e tal
E eu aqui, tomando chá quente, lavando roupas, rasgando meus dedos no violão, fazendo calos na alma, contando todo tempo que posso e guardando recordações futuras em um museu de sentimentos
Amor de hora e data marcada, sem prazo de validade, esperando, imaginando, me contorcendo de ciúmes, sobrevivendo
Mesmo que minha missão acabe, mesmo que o inglês me saia de vez dos lábios e da memória, mesmo que a língua mãe volte a ser pronunciada e sentida nos meus pulmões, nada disso muda a realidade
Somos dois querendo ser um, somos notas musicais aleatórias tentando caber na sinfonia da vida, formar no futuro uma linda canção antiga
Separados e juntos, sempre
E assim fazemos o impossível acontecer a tanto tempo que eu nem sei mais contar
A não ser pelas rugas no meu rosto, pelo fato da gravidade me curvar um pouco mais para baixo todos os dias
Me atrapalho e desconfio dos efeitos da sua ausência, e tudo fica mais frágil, inclusive eu
Eu vejo e sinto o tempo passar, com e sem ela

Roberta Moura



sexta-feira, 16 de março de 2018

Sentimentalidade



Não me prometa nada, não jure, não queira nosso amor tão diferente assim
Mas me encante os dias e voe sobre o meu quarto a noite para me ver dormir
Não nos julgue, não nos proíba, não nos manipule somente na imaginação
Mas se espalhe nas nossas memórias e planeje o dia de vitória, com casa cheia e mesa posta
Não há nada que ponha tudo em seu lugar, bem sei, meu lugar sempre esteve aí
Mas também não nos coloque na geladeira, na prateleira das coisas inúteis, tenha a atitude de nos redimir
Não nos machuque, não se espante, não abuse de mim
Mas me ame, com toda leveza e sentimento que ainda temos para descobrir
Não se apresse, não atropele, não se desiluda, não desista de mim
Mas me tome em seus braços e me faça dormir, para acordar no nosso dia e não mais ter que te ver partir
Não se esforce tanto para provar o que eu tenho certeza, não esmoreça, nem perca a inocência dos nossos abraços
Não durma com qualquer um ao seu lado, não lecione nossos segredos, não compartilhe a nossa cama virtual
Mas guarde nosso encantamento, nossa delicadeza, a safadeza discreta, nossa admiração devota
Faça tudo e nada faça enquanto você não estiver por aqui


Roberta Moura






quarta-feira, 14 de março de 2018

De onde




De onde vem essa cobiça, essa sede
Essa gana toda, essa certeza
De onde parte essa sua súbita ambição por mim
Essa minha complacência inédita, meu aceite eterno
De onde surge essa nossa coragem
Essa sua disposição, esse apego, necessidade
De onde vem a cura para a nossa agonia
Essa saudade incessante, esse quase desespero
De onde vem esse cheiro, essa sensibilidade
Essa imagem que atormenta e faz sonhar, essa claridade
De onde vem essa certeza, essa garantia, o anseio
Essa confiança de que tudo vai dar certo, vai se encaixar
De onde vem esse “sujeitamento”, esse enfrentamento
Essa paz de viver, esse apego danado, o coração apertado
De onde vem essa vontade de você

Roberta Moura



terça-feira, 13 de março de 2018

Follow


Eu te sigo e você me segue
Nos encontramos onde ninguém nos acha
Eu te sigo e você me segue, desde sempre assim
Faz parecer fácil o abismo que nos circunda
Segura a minha mão, lê os meus olhos, toca a minha cintura
Não quero flores mortas como presentes, mas beijos vivos
Quero que me siga como eu faço
Eu te sigo e você me segue
Nesse emaranhado de problemas e sentimentos nos achamos, sempre
Faz o que ninguém mais faz, deita no meu peito, esse é seu lugar
Acorda do meu lado, de bom ou mau humor
Sou seu namorado, refém dos seus caprichos
Faz de conta que nada mudou, que ainda somos os mesmos
Sem ataduras na boca que nos impeça de dizer o que pensamos, o que sentimos
Seja para mim o que sou para você, um amor sem ponto final
Sem cobranças, sem exclamações, sem interrogações
Deixa tudo isso passar, deixa todos os pensamentos tortos pra lá
Faz de mim o que sempre fiz de você, uma reticências enigmática, silenciosa e viva
Me segue que eu te sigo
Deitada na rede, no carro, na rua
Tudo o que precisamos é de nós, mais nada
Me procura que eu te acho
Se enrola em mim e gruda
Alcançaremos o céu, esse é o nosso único limite

Roberta Moura







segunda-feira, 12 de março de 2018

Pode o que poderia




Poderia ser minha mãe, meu pai, minha namorada
Poderia ser meu marido, minha esposa, meu homem
Poderia ser a minha mulher, o meu primeiro e único amor
Poderia ser meu caso, minha concubina, minha charada, meu caos
Poderia ser minha esfinge, meu segredo mais profundo, meu querer
Poderia ser meu cotidiano, pai dos meus filhos, meu sobrenome
Poderia ser minha imoralidade, meu calcanhar de Aquiles, minha fraqueza
Poderia ser Romeu e Julieta dos dias modernos, poderia não ser nada disso
Poderia ser meu príncipe e eu proletariado, poderia ser aceitável
Poderia ser um casal, casar de véu e grinalda, poderia se divorciar
Poderia ser oficial, dar certo ou dar muito errado
Poderia ser menos frágil, menos surrado, mais corajoso
Poderia ser meu brinquedo, minha fantasia, meu algoz
Poderia ser meu mestre e eu masoquista, poderia ser um par
Poderia ser menos complicado, mais simples, mais fácil
Poderia ser questão de escolha, uma troca significativa, poderia abandonar tudo
Poderia ser ignorado, abandonado, sofrer calado e se arriscar a sentir falta
Poderia recomeçar do zero, matar do coração toda a cidade, assassinar os outros amores
Poderia fazer um estrago danado, poderia talvez simplificar
Mas essa coisa nasceu para o bem e não para o mal
Nada disso impede de existir, de resistir, não deixa de ser o que é 
Quis o destino que não fosse nada disso e tudo isso
Quis o destino que fosse a menor das palavras e também a mais forte
Chamo de amor, assim por ele também sou chamada e isso basta para definir algo tão intangível, singular, inédito e mais forte que todas as nomenclaturas, títulos e rótulos
E a gente descobre que pode ser tudo isso e mais um pouco, que é para o outro todos os significados, o que importa é poder ser e é, o tudo

Roberta Moura



domingo, 11 de março de 2018

Aquelas mãos



Naquela tarde sentou-se ao meu lado
Parecia que não tinha feito uma eternidade desde o último adeus
Mãos que se procuravam, olhos que se desencontravam propositalmente para não se entregarem
Muito clichê, tão manifesto
Parecia não ter havido um abismo, aprecia nunca ter duvidado
Foi assim
Mãos que se tocavam esporadicamente, intuitivamente, conscientemente provocadas
Toque na pele, tortura na alma, todo torpor
O desejo, o carinho, a posse, o cuidado
Ah, é o amor!
Pareciam nunca terem ido embora, nunca foi
Mãos que se encaixam, que suam, que saciam, que alcançam, que tocam
Provoca meu coração, que o provoco a aspiração
Aquele que desperta coisas entre meu cérebro e ventre, sobre as quais não tenho controle
Um amor sem tamanho, sem prazo de validade, sem pudor
Escondido e entrelaçado pelo balé das mãos o amor desenha o momento
Se pegam escondidas, se agarram
Encostam, transpiram, refletem os olhos, a alma
Mãos orgásmicas de satisfação, que querem ficar
Toca minha perna, me morde no pensamento
Eu te desenho em todas as nuances à meu modo
Vamos juntos ao delírio de se querer bem, de querer quem te quer
Mãos silenciosas, carentes, indecentes
Aspira tudo em mim e me conta todos os seus segredos
Todos eles!
Saiba que sou tua, sempre tua, toda tua
Naquela tarde fomos felizes, já era sem tempo de ser
De ter por perto, por fora, por dentro, de volta para mim
  

Roberta Moura



sábado, 10 de março de 2018

Fica


Perde o sono
Oscila a fome
Sente saudades, todo tempo
Transpira e resfria a mão
Palpita o coração à vista de qualquer coisa que remeta a sua figura
Gela
Borboletas no estômago
Noite em claro
Chama a chama
Ressaca de amor
Pensamento em um só lugar
Passa em frente
Para do lado
Começa o dia esperando, tramando o reencontro
Não se sabe o que fazer
Mas se faz, precisa ser feito
Pira o cabeção
Só pensa nisso
Faz amor em pensamento
Fica perto todo tempo
Quer ficar
Pensa em como seria
Sente medo
De novo
Apego e o cuidado
Grude
Passa o tempo e não passa
Promete
Fica
Separados seriam só palavras
Sempre amor
Unidos, sempre, de novo, contínuo, em marcha
São o infinito
Um sonho bonito
Se é que é isso que se chama amor


Roberta Moura

sexta-feira, 9 de março de 2018

Abstinência

Londres - Abby Road, Dez2016.


Substantivo feminino, ferocidade que devora o corpo e a alma
Falta de si mesmo, de algo, um pedaço, da droga que alimenta e cura
Uma dia é o bastante para provocar a fissura que lhe faz perder a razão
Zanzando no mundo, o viciado segue desorganizado, incompreendido no tempo e espaço
Correndo atrás, rendendo toda atenção ao seu maior prazer
É o símbolo humano do desejo, da falta, da vontade 
É um excesso desnecessário do presente sem se ter
Na seca, procura qualquer coisa que umidifique o ambiente, água gelada é indicado
Mão que esfrega a nuca, que tenta acalmar sozinha o corpo
Mãos suadas e geladas, o corpo entra em ebulição interna, é o que a falta faz
Pressiona o corpo em determinada medida procurando acertar, tenta aliviar a pressão, tenta imitar
Jamais encontrará a precisão, tudo isso em vão 
Nada substitui o objeto, o vício, a coisa, o sentido, a pessoa
Resta um chamado vazio e particular
Uma saudade descomunal, resta o inconformismo
É ter grades invisíveis e muros feitos para serem pulados, com tudo o que interessa do outro lado 
Extremamente particular, íntimo, delicado, palpável e pessoal
Resta a curiosidade se é assim só para uma das partes
Resta ao viciado a espera, a cura, a dor, a secura e o desejo
Tem que haver um jeito, tem que haver saída, tem que valer a pena tudo isso
Tem que dar certo, que sarar, que normalizar
Tem que ter medida, um caminho que evite a overdose, mais um final


Roberta Moura


quarta-feira, 7 de março de 2018

Ilegais

Rio Tinto - mar2018

Para um homem como eu, esse sentimento nunca será lecionável, questionável
Faz tempo deixei de tentar entender
Prefiro doses homeopáticas que a abstinência, que a overdose que é te amar
Toma meus poros e todo o resto de pudor que ainda guardo
Me guarda em teu colo, em teus peitos, no cangote, me adote, porque eu quero me aninhar
Na fragilidade de quem ama, na altura do meu grau, de repente o doce pode se por amargo
Arriscado demais perder pela milésima vez quem nunca se foi
Então me permita te amar levemente e sempre, até ver onde isso vai dá
Devagar com o andor que o santo é de barro e a fonte já teve dias de mais abundância, a seca castigou e ensinou
Então me permita abstrair nossos erros e começar novamente
Entenda que para mim, controlar o tempo sempre foi o mais difícil, saber a hora certa, acompanhar os seus vícios e não me deixar sucumbi
Recatada e do lar ela me pinta do avesso e desvenda com um olhar todos os meus segredos, que nem a mim mesmo permiti libertar
Apaixonar-se é bom, sinal de vida
Apaixonar-se duzentas vezes pela mesma pessoa é quase sobre-humano, é pedir demais para esse cristão suburbano, que pouco tem no que se apegar
É exigir demais de um coração semântico como o meu e eu preciso me resguardar
A paixão não tolera abandonos, eu aprendi isso com as sequelas dos verões passados
Então o que devemos fazer para não despencar de novo, não deixar desandar?
Ah se eu me permitisse ao luxo de devorar-te novamente, com todo o canibalismo entranhado em meus dentes, sem em nada titubear...
Moça bonita de flor no cabelo, devagar e sempre, vai me amando lentamente até tudo se ajeitar
Espera no tempo, guarda meu corpo e minha alma em tua memória
Porque se isso for mesmo o que pensamos ser, tudo vai se ajeitar
Te perder novamente eu já não posso, prefiro deixar de ganhar
Controla a ânsia e a sede para não ter que controlar o choro e a tristeza de não ter  mais você do meu lado para amar
Guarda o teu segredo, paga o nosso preço, porque o universo vai recompensar

Roberta Moura