Fazia calor
e o suor que escaldava meu corpo era prova disso
O cheiro de
protetor solar, o calçamento quente, o desejo por algo gelado que hidratasse os
lábios era igual aquele verão de 1999
Geraldo
Azevedo pronunciara quase profeticamente que haveria uma praça na beira do mar,
num pedaço de qualquer lugar
E o dia
branco se fez, eu estive lá
Vestida com
pouca roupa e adereçada com uma cabeça fervilhante não deixei passar “in albis”
a vista, os sabores, os amores
Eu vivi
cada dia daquele verão como se fosse o último
Mas que
pena que amor de verão nunca vem para ficar
Eu boba,
achando que sabia de tudo, provei o fel da inocência pela primeira vez
As crianças
também podem ser cruéis
Custa-me
acreditar que por pouco não sucumbi à tudo aquilo
Prefiro
lembrar das conversas na varanda, do namoro da rede, do passeio à beira mar
Há uma
infinita esperança atrelada ao amor, que promete que tudo vai dar certo, mesmo
que o óbvio assine o contrário
Sabia que
era amor desde quando permiti morrer ao avistar seus olhos castanhos, desde
quando adormeci minha melanina em sua pálida pele labial
Quando
sofri calada doces mordidas nas costas, a cada enfurecida e inútil discussão
sobre essas coisas de ciúmes
Sabia que vinha
para ficar quando me vi refém dos seus caprichos, do seu anseio, das queixas e
dos enganos
Era amor e
eu já sabia, só não sabia que isso me custaria tanto, custaria tudo, o resto
dos meus dias
Mas por
quem eu seria se não por você?
Sim, era
amor e podíamos ser e viver só da minha metade, poderia ter sido assim até que
você se tocasse daquilo que estava tão à sua disposição
Que tolice!
Amor pode
ser sentido por um só sim, pode estar em um e não no outro, pode tudo, pode
todos, pode ninguém e pode não escolher ser
Você
preferiu não ser
Era demais
Era apenas
amor e era todo seu
Debaixo do
chuveiro, na ponta da cama, no sofá, debaixo da mesa, na calçada entre outras
pessoas, na praia, no mar, era assim, mesmo se fosse só de uma metade
Foi amor na
despedida, na dor, na substituição, no preço pago por sua curiosidade, no
acordar da ilusão de amar só, nas mentiras cretinas, foi amor na paciência, na
quase raiva, na mágoa, foi amor nos inúmeros recomeços
É amor
quando se sente saudade, quando falta o barulho da voz, quando há falta até das
letras, das imensas e confusas correspondências, nas inevitáveis comparações
É amor
imortal quando se transforma em arte, se perpetua mais que a vida humana,
quando é atemporal, quando se imagina como teria sido se não fosse só de um,
fossem dois querendo amar igualmente
Roberta
Moura