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Todos os dias a Arte me toma de assalto e me leva para a Vida Real. Troco palavras, vejo pessoas, vivo um dia após o outro, como se o de ontem não tivesse existido, como se o de amanhã ainda estivesse muito longe de chegar.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Calor




Fazia calor e o suor que escaldava meu corpo era prova disso
O cheiro de protetor solar, o calçamento quente, o desejo por algo gelado que hidratasse os lábios era igual aquele verão de 1999
Geraldo Azevedo pronunciara quase profeticamente que haveria uma praça na beira do mar, num pedaço de qualquer lugar
E o dia branco se fez, eu estive lá
Vestida com pouca roupa e adereçada com uma cabeça fervilhante não deixei passar “in albis” a vista, os sabores, os amores
Eu vivi cada dia daquele verão como se fosse o último
Mas que pena que amor de verão nunca vem para ficar
Eu boba, achando que sabia de tudo, provei o fel da inocência pela primeira vez
As crianças também podem ser cruéis
Custa-me acreditar que por pouco não sucumbi à tudo aquilo
Prefiro lembrar das conversas na varanda, do namoro da rede, do passeio à beira mar
Há uma infinita esperança atrelada ao amor, que promete que tudo vai dar certo, mesmo que o óbvio assine o contrário
Sabia que era amor desde quando permiti morrer ao avistar seus olhos castanhos, desde quando adormeci minha melanina em sua pálida pele labial
Quando sofri calada doces mordidas nas costas, a cada enfurecida e inútil discussão sobre essas coisas de ciúmes
Sabia que vinha para ficar quando me vi refém dos seus caprichos, do seu anseio, das queixas e dos enganos
Era amor e eu já sabia, só não sabia que isso me custaria tanto, custaria tudo, o resto dos meus dias
Mas por quem eu seria se não por você?
Sim, era amor e podíamos ser e viver só da minha metade, poderia ter sido assim até que você se tocasse daquilo que estava tão à sua disposição
Que tolice!
Amor pode ser sentido por um só sim, pode estar em um e não no outro, pode tudo, pode todos, pode ninguém e pode não escolher ser
Você preferiu não ser
Era demais
Era apenas amor e era todo seu
Debaixo do chuveiro, na ponta da cama, no sofá, debaixo da mesa, na calçada entre outras pessoas, na praia, no mar, era assim, mesmo se fosse só de uma metade
Foi amor na despedida, na dor, na substituição, no preço pago por sua curiosidade, no acordar da ilusão de amar só, nas mentiras cretinas, foi amor na paciência, na quase raiva, na mágoa, foi amor nos inúmeros recomeços
É amor quando se sente saudade, quando falta o barulho da voz, quando há falta até das letras, das imensas e confusas correspondências, nas inevitáveis comparações
É amor imortal quando se transforma em arte, se perpetua mais que a vida humana, quando é atemporal, quando se imagina como teria sido se não fosse só de um, fossem dois querendo amar igualmente


Roberta Moura 



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