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Todos os dias a Arte me toma de assalto e me leva para a Vida Real. Troco palavras, vejo pessoas, vivo um dia após o outro, como se o de ontem não tivesse existido, como se o de amanhã ainda estivesse muito longe de chegar.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Conversa de Botas Batidas



Essa conversa de chinelo velho para pé cansado não me convence
Mais parece que, por obrigação, é preciso encaixar o surrado com o envelhecido
Para mim, não possa de contra gosto do desejo
Apaziguar os ânimos, aquietar o coração ao invés de se somar a um grande amor
É necessário coragem para imaginar e entender que o ponto final da passagem vai além do que se possa idealiza
Caminhar, sem cessar, procurar um novo lado, o lado de lá
Voltar, sentir, tentar outra vez, não desistir, sem emburricar o destino, sem querer brincar de deus
Não é o ponto de chegada que importa, mas o apreendido ao longo do caminho
A terra batida carregada na soleira, de tons e texturas diferentes, que torna o calçado mais valioso
Gosto de arrumar em pares, de forma retilínea e metódica, saber que, onde um vai o outro vai atrás
Por puro querer, mais que qualquer carência do outro, por vontade
Os pés não precisam de sapatos para sobreviver, nem o sapato precisa dos pés, apenas convivem, apenas coadunam no caminhar
Bem diferente do par, que foi criado para aquele designo, precisão científica de ser metade de um só grupo
Que parece separado, mas que sempre estarão juntos, além do número que lhe marca o tamanho, além da linha, to couro e do tangente, além de quem usa, de quem joga fora, da linha, além da gente
A não ser que seja o Saci que o tenha adquirido, os pares não se separarão até que estejam totalmente gastos pelo caminho, pelo tempo, pelo uso, pelo destino ao qual foram lançados, desde o código de referência contraído na fábrica
Os pés, nem mesmo para serem fies servem aos sapatos, quanto mais pares melhor
Gosto de pares, de quem compartilha experiências, gosto de partilha, de semear a união, a alegria e a providência
Feitos da mesma matéria, os pares tendem a acabarem ao mesmo tempo, vindos de tantas viagens, cansados de carregar uma enorme bagagem, uma vida inteira em comum nas suas costas 
Luiz quinze e coturnos não combinam, sejamos francos, as estradas e as preferências são extremamente distintas, porque então insistir em junta-los, em calça-los em um pá de pés que mas parecerão aleijados(?)
Existe uma linha tênue entre a insistência e a perseverança que precisa ser observada para não ser ultrapassada
A perseverança é um ato de coragem, de transgredir a realidade na expectativa de lograr êxito na conquista, já a insistência é o ultrapasso do limite da perseverança
Tantas vezes acreditamos na insistência que ultrapassamos o lógico grau da falência, como viver nadando no seco, pelo amadorismo de não dá o braço a torcer
Assim como a grosseria e a sinceridade
Não gosto de pessoas que usam a sinceridade como desculpas para utilizar da bruteza, para agredir verbalmente outrem
O silêncio nunca é burro, é uma qualidade acessória que cai bem para qualquer sapato, até porque sua função precípua não condiz com a atividade de falar
Nasce para ser pisado e, geralmente, faz por merecer cada passo


Roberta Moura



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