Lisboa, Jan/2017
Silenciosa noite em terras Lusitanas
Debruçada no parapeito de uma janela toda azul eu olho o tempo passar e somente
a demora chegar
Mas, uma hora ou outra ele chega, sem fazer alarde, como quem não quer
nada
Soltando mil impropérios para tomar meu tempo, minha imagem, minha
imaginação
Chega sedento mas propositalmente acanhado, como quem pisa em ovos
Tomando minha virgindade das palavras, coisas que jamais falaria para
qualquer outro alguém
Chega para provocar
Desço do salto e empunho na mão esquerda uma xícara de chá fumegante
Engulo cada palavra que ele fala, rasgando a garganta com chá quente e
torpor
Fito a sua fala com um olhar que me entrega toda
Olho sua boca e sinto cada visgo daqueles lábios passeando sobre o meu
corpo
Minha imaginação me faz pecar a cada segundo que deito os olhos sobre
ele
Ele me quer, eu penso, ele me quer eu confirmo
Entre uma palavra e outra ele provoca meus sentidos, chega mais perto,
posso senti-lo
Entrelaçando esse sotaque lúdico com a minha vontade de cala-lo com um
beijo
Chega mais perto, pede para ficar por essa noite, dormir e acordar aqui
Eu, eternamente rendida aos seus encantos, mais uma vez cedo a sua sede
Não me faço de rogada, a timidez não visita a nossa nudez, não conta
conosco
Irreparáveis!
Irreconhecíveis quando unidos
Incompreendidos...
Nada mais importa quando embaraçamos as pernas e o coração
Ninguém mais
Somos só nós dois, novamente e eternamente nós dois
Fazendo o que ninguém mais faz com tamanha maestria, sem precisar de
ensaios, sem manual e instruções
Somos nós dois, dois iguais e distintos amantes, aprendendo e
experimentando tudo juntos
Incorrigíveis!
Ele fala para eu não me preocupar
E eu encho novamente a cara de chá
A cabeça dele, todas as borboletas que enxergo desfilar sob ela, tudo
isso que me confunde e clareia o presente, nada que substitua sua presença em
minha vida e a minha na dele
Cumplicidade!
Ele reclama da minha pressa pela vida, eu reclamo do seu sono, juntos
nos calamos contemplando cada segundo da nossa presença
Não vale a pena a discussão, não vale a pena a perca de tempo
Quando se quer beijos, pernas, mãos, olhos, cheiro, movimento
Quando se quer tanto alguém há tanto tempo que não resta mais nenhuma
alternativa plausível que vença a vontade de ser, de estar
Não há oceano que separe duas vidas que nasceram para se fundir
Se houvesse, seria oceano móvel, porque daríamos um jeito de tirar do caminho
Se houvesse, seria oceano móvel, porque daríamos um jeito de tirar do caminho
Não há medo nem desentendimento que abale a confiança
Ele me conhece e eu o conheço tanto que até seus defeitos tornam-se
adereços da sua plenitude
Amanhã ele vai embora, volta a sua realidade pesada e cansativa, comigo
na cabeça, no corpo marcado e no coração
Sou sua mulher, sempre serei sua mais fiel confidente, seus ouvidos mais
atentos, sua parceira, sua compreensão desmedida, seu amor para toda vida
Roberta Moura
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