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Todos os dias a Arte me toma de assalto e me leva para a Vida Real. Troco palavras, vejo pessoas, vivo um dia após o outro, como se o de ontem não tivesse existido, como se o de amanhã ainda estivesse muito longe de chegar.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Expresso 510




Espero sentada porque de pé cansa
Resumo e identifico os rostos fadigados em pleno início da manhã
Geralmente, todos já acordam com sono
Vivemos diariamente na expectativa de que algo novo aconteça
Muitas vezes, não fazemos nada para que isso advenha
Olhamos para a esquerda e esperamos o 510 abordar
E ao chegar, no máximo um bom dia ao cobrador, contamos as moedas que tantas vezes nos sobra, e que quando nos falta pode até fazer não chegar lá
Da janela, no meu lado esquerdo vejo prédios tomando o céu, vejo a moça olhando a vitrine, o menino limpando o pára-brisa do senhor, vejo o tempo sofrer toda vez que o semáforo aponta o verde, retorno a olhar o relógio
Que nó! Que caos!
As coisa e o tempo parecem não passar...
As pessoas silenciam como se nada que acontece ao seu redor fossem digno de sua atenção
Todo mundo se faz de surdo e mudo, muito embora, na maioria das vezes, só precisam que alguém lhe chame no ato da conversa, que iniciem
Que pobreza, que miséria... para onde foi o nosso diálogo?
As avenidas largas me toram cada vez menor
Consumo satisfeita todo o gás carbônico produzido pelo motor que me leva
Encho-me de coragem, puxo papo com um estranho com uma cínica e provocativa vontade, gosto de surpreender
No ato da procura por vítimas caço a mais fraca, inerente a minha função de predadora, talvez para que a minha tentativa de plano logre êxito, talvez por medo de ser ignorada, como falava no início dessa conversa, como costuma fazer
A maioria nem nota o que acontece aqui dentro, impressionadas com o que acompanham lá fora, deixam de prestar atenção no que incide aqui
Enquanto a mulher da minha frente acomoda os peitos no sutiã, o velhinho do canto limpa suas narinas de forma confortável com o dedo indicador, a garota do meu lado acompanha o Twitter pelo celular, o rapaz do outro lado cobiça o celular da “Twitteira”
Todos tão encantados com seus próprio e medíocres mundos, que deixam de perceber a riqueza de divertidos detalhes do seus cotidianos
Basta uma frenada para que todos compreendam que existe um ser humano dirigindo aquela máquina, isso é o suficiente para ao mesmo tempo que o-percebem venham a critica-lo
O rapaz esquece de pedir parada e reclama da sua própria sorte, como quem se culpa por ser tão incompetente ao ponto de nem saber onde vai parar
Numa dessas paradas, me assusto com alguém calçado de pernas de pau, tenho que confessar que não esperava deparar-me com alguém nesse estado, muito menos pintado de palhaço, a essa hora da manhã
Coitado, tão trabalhador ou mais que eu... e eu, com meus traumas de infância...
Uma senhora grita lá de trás: “-motorista, na próxima!”
O motorista, que além de ser xingado frequentemente, faz as vezes de guia turístico e a olha com vista de repulsa, e só espera que a “velha” desça do ônibus para confessar-se para quem estiver do seu lado, como se amigo ou confidente fosse e soltar-lhe um palavrão
Confissões a parte, gosto desse movimento, e sinto falta por não acontecer com frequência
Tenho para mim que a vida é um enorme laboratório artístico, onde as cobaias somos nós mesmos
Ao contrário dos que amaldiçoam, sou a favor do transporte coletivo, que além de ser uma boa alternativa para a “saúde do planeta” e para o nosso trânsito, é uma sumidade no trato de unir pessoas de diferentes mundo, torná-los, de fato e de nome, “coletivos”
Divirto-me com as situações da “divina comédia do cotidiano”, e quase que por um minuto, levada pela nostalgia, chego a esquecer que meu o carro está quebrado e que tenho que puxar a cordinha antes de chegar ao mecânico, ou serei a próxima a ser excomungada pelo motorista


Roberta Moura

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